Pensar em Gillian Anderson é, inevitavelmente, pensar em Dana Scully. Mesmo para os que acompanham a série Hannibal, cuja terceira temporada volta em junho, basta uma rápida pesquisa em qualquer lugar que Arquivos X vem em destaque. Ainda mais com os rumores de um retorno da série para o próximo ano. Talvez tenha sido na série de agentes do FBI que investigam alienígenas, paranormais e intrigas governamentais que Anderson arriscou uma primeira incursão com o teclado: escreveu um episódio.
Agora a ousadia é maior e tem como parceiro Jeff Rovin na autoria de Uma visão do fogo, obra lançada em português pelo selo Fantasy da editora Casa da Palavra, já desde o título uma clara história inicial para algo ainda maior, a Saga do fim do mundo. Enquanto o mundo não termina, fica a expectativa, o que tem sido constante na obras para jovens que abordem capa, espada, vampiros, bruxos ou alienígenas.
Alienígenas? É isso que Dana, ou melhor Gillian Anderson oferece ao leitor? Será que sua expertise em extra-terrestres a levou ao livro? O início não decepciona: no prólogo, é encontrada uma pedra cuja origem é uma dúvida e seus exames tomariam muito tempo do geólogo Sam Story, não tivesse o objeto sido roubado logo na terceira página. Por muitos capítulos não se tem notícia da rocha, mas personagens interessantes tomam a narrativa.
Em meio às negociações pela paz na Caxemira, o embaixador Ganak Pawar sofre um atentado, presenciado pela filha. A princípio, o tiro sem sucesso foi o estopim para mudanças no comportamento da jovem, que passou a ter convulsões, a se arranhar e a emitir sons que parecem não ter significado algum. Para tratá-la, entra em cena a psiquiatra Caitlin O`Hara, pesquisadora conhecida não apenas pela qualidade de seu trabalho, mas pelo altruísmo profissional ao dedicar-se a causas humanitárias. Com a paz asiática pressionando o tratamento, o trabalho de Caitlin se mostra mais uma investigação, que encontra outras manifestações estranhas no Haiti e em Teerã, ambas com aparente ligação devido às semelhanças com o comportamento de Maanik, filha do embaixador.
Nesse cenário global, a história apresenta personagens, culturas e contextos que passam por preconceitos, lutas territoriais, medicina, religião e muitas ações inexplicáveis e, a princípio, dispersas no tabuleiro dos acontecimentos. No entanto, nada parece ocorrer sem propósito: quando os capítulos seguem com o mesmo personagem, geralmente Caitlin, percebemos o desenrolar da pesquisa, mas a quebra para outros acontecimentos e personagens, se não estranhos, pelo menos quase esquecidos, ampliam a tensão.
Porém, em alguns momentos essa ampliação se torna excessiva. A primeira parte do livro, dividido em três, mostra sem pressa ao leitor o desenrolar da cena, mas com poucas deixas ou explicações aparentes, culminando num suspense ao final. A segunda parte… também. Acaba por tirar um pouco o ritmo no momento em que ele deveria buscar passar a marcha: surgem bons personagens e em alguns instantes a história prende, mas questões até pragmáticas deixam o leitor de pé atrás (como uma viagem relâmpago conseguida para Teerã para uma mulher que vai fazer uma pesquisa e ela nem se encontra com os médicos com os quais deveria pesquisar).
E assim começa à terceira parte, quando todo o enlace armado no início e prolongado no meio se encaminha para apertar o nó. Como desde a capa fica claro, o nó só vai ser concretizado no futuro, por isso o que importa é a jornada, que compensa os momentos de lentidão com referências culturais distribuídas no tempo e no espaço, passando por vikings, mongóis, hindus, vodu, oriente, ocidente, passado, presente e… futuro?