TUDO QUE UM GEEK DEVE SABER | LITERATURA

Tudo que um geek deve saberA capa do livro não deixa o leitor se enganar: machado, espada, anel, D20 e pixels. Não sabe o que é um D20? Calma, pode continuar a ler, vai ser um aprendizado de mais de 400 páginas. O subítulo esclarece ainda mais: uma incrível jornada épica entre RPG, jogos online e reinos imaginários. Sabe aqueles adultos fantasiados que seguem um manual de regras e não são chefes dos escoteiros e nem psicóticos? Se bem que alguns são psicóticos… Enfim, este é um livro sobre eles e escrito por um deles.

Ethan Gilsdorf (é o nome dele mesmo, bem élfico) é um jornalista que conseguiu superar a existência monstruosa (palavras dele) da mãe após um derrame quando conheceu Dungeons & Dragons. Através do RPG, respirava por caminhos, mundos e vidas que tinham outros tipos de monstros, os quais enfrentava e lhe davam tesouros e pontos de experiência (XPs). Passava horas de vários dias da semana nos porões ou garagens dos amigos comendo Doritos, tomando refrigerante e jogando dados. Se você acha que isso é coisa de gente retardada, volte para sua vidinha e pare de ler isso aqui. Ou tente essa experiênca, nunca é tarde, como o próprio Gilsdorf descobre no livro.

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Quando foi para a faculdade, o autor se desligou dos jogos e partiu para novas descobertas profissionais e pessoais, que foram do encontro com a carreira aos desenlaces amorosos. Muitos anos depois do último lance de dados, com a mãe já falecida. Resolveu parar de conter o ímpeto nerd que gritava dentro dele e voltou, aos poucos, a se envolver com RPG, jogos online e a referência suprema: O Senhor dos Anéis.

Começou sua jornada de redescoberta com Tolkien e foi até a Inglaterra conhecer o espaço frequantado pelo criador da Terra Média. Visitou a casa, os pubs e conheceu pessoas que viviam ali e seguiam os passos do poeta inglês. Ali topou com Mark Egginton, soldado britânico aposentado, que o encantou por fugir de estereótipos que geravam preconceitos no próprio Gilsdorf: “Ele era um modelo de conformidade: totalmente centrado, adulto e maduro. Seus cabelos eram bem penteados, ele conversava racionalmente e olhava nos olhos do seu interlocutor. (…) Egginton também não se desculpava ou lamentava a atração que sentia pela Terra-Média.”

Voltou para os Estados Unidos, onde participou de feiras, jogos, LARPs (situações em que os personagens são realmente vividos pelos que os interpretam, incluindo figurinos e, em casos de luta, porrada de verdade, mas com espadas de espuma ou até de madeira, com armaduras fortes o suficiente para resistir; e regras, sempre com regras). O tempo todo acanhado, conversou com pessoas, tietou Sam Gangee (ou o ator do filme) e lutou internamente contra a vontade de deixar tudo sair. Estaria ele preparado para o que o mundo pensaria?

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O tempo todo retoma a questão amorosa. A namorada não gostava de seus comentários geeks e ele se envergonhava por isso. Aos poucos, foi se deixando entregar ao que realmente era: geek. O namoro sobreviveria? Ele realmente queria se anular para estar com ela? E volta e meia retoma também os momentos da infância, a felicidade que sentia em poder fugir para os mundos fantásticos nos quais podia fazer o que quisesse, desde que tivesse Inteligência, Sabedoria, Destreza ou Força para tal. E sorte.

Seguindo a jornada, encontra fazedores de protótipos, colecionadores e mesmo criadores de jogos (por questão de meses não conheceu o criador do D&D, falecido pouco antes da convenção de que Gilsdorf participou). Todos fanáticos, obcecados e nem por isso lunáticos: eram profissionais, adultos, pais de família e mesmo casais com filhos que iam em grupo para os eventos, nos quais apenas o jornalista perdido parecia não saber como se comportar.

Como última etapa de sua busca, visita a Terra Média, ou melhor, a Nova Zelândia, onde toda uma estrutura foi desenvolvida para os turistas de Frodo e a Sociedade do Anel. Ali entende como aquele mundo mágico desenvolvido por Tolkien pode ir muito além de páginas e de telas para modificar as vidas das pessoas. E a dele não poderia ficar de fora.

Faz pouco tempo, depois de anos de jogos nos tempos de colégio, que meus amigos voltaram a se reunir em torno de uma mesma mesa ou em mesas diferentes, mas conectados pela internet. Não é um MMO, é nosso bom e velho RPG de volta, e Dungeons & Dragons, em sua nova edição, fez com que profissionais de diversas áreas (tem professor, médico, empresário, arquiteto…), todos casados e alguns com filhos, se organizassem para, uma vez por semana, viver seus personagens diante dos amigos, ansiosos pela chance de fazer o próximo rolamento de dados. Sem vergonha por isso.

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