Uma história, seja nas páginas de um livro, nas cenas teatrais, nas imagens de cinema, é tecida de conflitos. São eles os motores de cada trama. As engrenagens dos personagens se determinam pela maneira como eles buscam interferir, modificar, ultrapassar (ou não, já que omissão e apatia também são escolhas e atitudes) as situações conflitantes impostas pelo autor.
Sendo assim, a história de Bella Andre em “Quando um homem ama uma mulher”, da Editora Novo Conceito, destoa dessa prerrogativa. O envolvimento de Mary Ferrer e Jack Sullivan está mais para o campo de um relato, do que propriamente de uma história. Trata de uma trajetória linear de amor, pois nas primeiras páginas já se sabe que o casal irá ficar junto, sem qualquer surpresa. Afinal, a própria autora abre o livro esclarecendo que o escreveu devido a pedidos de leitores, ávidos a saber como os progenitores do clã Sullivan (são oito filhos) encontraram-se pela flama forte de afeto e excitação.
Não bastasse essa explicação, que diminui muito a expectativa com a trama, o prólogo situa o leitor nesse universo de pessoas tão superiores, com vidas longe de serem ordinárias. Enquanto pendura arranjos numa árvore de natal, Mary nos entrega a descrição psicológica e física, aparentemente sem grandes falhas, de cada um dos rebentos, antes de revisitar o passado de sua linda fábula amorosa. Essa é uma boa artimanha pra possíveis novos leitores que possam vir a se identificar com o mundo fictício de Bella, onde todos são lindos, sexys, bem-sucedidos e vão sim encontrar o amor arrebatador. Mesmo lendo apenas um título, a estrutura, a narração (cenas sexuais repetidas sem serem explícitas) e a ambientação dessa autora parecem se manter, já que ela conquistou uma legião de fãs surpreendentemente dedicada.
O início do romance até carrega certa graça e avidez. Jack é um engenheiro que passou 10 anos desenvolvendo a agenda eletrônica de bolso junto com colegas de faculdade. Para que seu produto seja lançado, precisa arranjar um apelo sexual. Por melindres do destino, ele passa por um local em São Francisco, onde a linda e estonteante modelo Mary Ferrer, natural da Itália, está posando para a última sessão de fotos da carreira de 13 anos. Não é só amor à primeira vista. É fascinação, desejo, atração. A partir disso, a história intercala os pontos de vista de cada um, com seus pensamentos, medos e compulsões.
O primeiro e mais interessante entrave é a indefinição, para Mary, se Jack a deseja realmente, ou se vai usá-la, como os demais ex-amantes, fingindo amores para se beneficiar da sua imagem pública de sucesso. Como ela aceita ser a garota propaganda da agenda eletrônica de bolso sem muita resistência, apesar de estar aposentando, eles decidem não se envolver enquanto não quitarem os compromissos profissionais. O relato tenta construir percalços, mais psicológicos até, uma vez que Mary tem traumas e assuntos não resolvidos. Porém, essas dificuldades funcionam apenas como detalhes, porque não haverá dúvidas de que Jack ajudará Mary (atenciosa com crianças, cozinheira exemplar) a superá-los, enquanto esta vai propiciar a ele uma vida familiar de tranquilidade e paixão.
Quanto ao segundo empecilho a ambos, este aparece e se resolve na velocidade da luz, pois superada a pendência amorosa, chega a hora de a protagonista reestruturar seu passado em prol do futuro com Jack. Essa quebra no andamento da história compromete um pouco o ritmo, já que estamos acostumados ao capítulo final como sendo o de amor. Nesse caso, o happy end se prolonga como um singelo mar tranquilo e sem graça. E se o leitor decidir que aprecia obras dessa toada diferenciada, Bella Andre se estira como resposta segura. Também não há conflitos nessa escolha pessoal.
