Enquanto estamos vivendo um colapso mundial, em meio a pandemia da COVID-19, os jogos tem sido um bom refúgio e gerado bons momentos de reflexão. E enquanto vemos um garoto salvar a irmã sendo atacada por um cachorro, series sendo lançadas para assistir, filmes antigos sendo vistos por muitos, para muitas pessoas, apenas os videogames oferecem a imersão que tanto desejamos. E Death Stranding pode ser uma saída para isso.
Procurando por esse tipo de imersão após uma semana de lançamento no pc, comecei a jogar Death Stranding (novamente), o mais recente jogo do famoso diretor Hideo Kojima. O que encontrei lá? Nada demais, apenas tudo o que estamos vivendo no mundo real, porém de forma digital, podemos dizer.
Notavelmente estranho e complexo, o jogo de Kojima é uma meditação prolongada sobre morte, solidão e conexão, nada além do que a realidade né? Mais do que apenas outro videogame de estúdio grande, o Death Stranding acaba sendo uma obra de arte perfeitamente sincronizada com a nossa nova vida pandêmica.
Como muitos outros jogos, Death Stranding começa em uma América pós-apocalíptica. No início do jogo, Sam é encarregado de reconectar a nação novamente, trazendo nova tecnologia de rede para os assentamentos humanos isolados. A mãe de Sam – que também é o último presidente dos Estados Unidos – que lhe dá essa tarefa pouco antes de morrer, e ela revela ainda que que a sua missão só pode terminar com o resgate de Amelie, sua irmã. Amelie foi enviada em uma jornada semelhante a de Sam, três anos antes, e agora está sendo mantida refém por terroristas que resistem à reunificação do país.
Olhando para o nosso atual momento, tudo o que temos em nossas mãos é o que mais nos une nesses momentos. Instagram, Whatsapp, Telegram, Twitter, Facebook, Facetime e muitos outros, estamos longe porém tão perto. E assim como na América de Death Stranding, o mundo está vivendo em isolamento e distanciamento completo, de uma forma diferente vista por Hideo Kojima, que nos apresenta uma chuva que envelhece, um vírus que corre o mundo, e a morte que vemos tão próxima enfrentando os BTs.
Você passa muito tempo sozinho em Death Stranding. Neste mundo desfeito, Sam é um “carregador”, cujo trabalho perigoso envolve principalmente levar suprimentos para pessoas desesperadas. (Essa narrativa, por si só, vincula o jogo a muitas de nossas situações por conta da COVID-19) Mas, enquanto você percorre paisagens fraturadas, pesadas por cem libras de carga, o jogo permite encontrar conexões e assistência.
Um dos aspectos mais marcantes do Death Stranding é a aparência dos outros jogadores. Este é absolutamente um jogo para um jogador, mas, ao percorrer seu terreno acidentado, você encontrará a marca desses outros: existem cordas e escadas para escalar montes íngremes, e pontes estabelecidas para atravessar rios cheios de correntezas, e os jogadores que passaram por essas coisas deixam pistas de como passar por aquele momento do jogo.
Death Stranding virou muito mais que uma simples jornada virtual
Assim como em Death Stranding, cada um tem seu modo de seguir e de deixar suas experiências na vida real, cada um de nós passamos de uma forma diferente por esse momento que assola o mundo, sempre trocando experiências de como tem passado os dias e os meses durante esse momento ruim e de fragilidade pra cada um de nós. É notável como um jogo pode funcionar como arte, dando-nos mais intimidade com nossas próprias experiências de solidão, ou com o desejo de prestar serviço. Experiências que se tornam universais quando todos enfrentamos vidas alteradas por coronavírus.
E, assim como nossa nova e estranha realidade, em que muitas das vezes você está sozinho em sua jornada (tanto real como digital), no jogo temos também o medo da morte. Obviamente, quase todos os títulos apresentam aos jogadores a possibilidade de morte, mas nos jogos sempre temos um novo continue, e por mais que algumas pessoas não tenham medo da morte, pelo menos tenha a empatia pelo próximo.
Com Death Stranding, Kojima queria, mais uma vez, criar um novo tipo de jogo que seria um veículo para explorar os maiores temas sobre ser humano em uma sociedade dividida. Então, em uma sincronização notável e inesperada de arte e realidade, esses temas foram os que mais importaram para a nossa jornada coletiva do COVID-19. E assim, Kojima mais uma vez conseguiu se superar nesse quesito e de forma magistral.
Então, pode parecer que Death Stranding é sobre Sam tentando unir os Estados Unidos, mas realmente os Estados Unidos são apenas um substituto para todos nós neste momento. É nossa condição de seres humanos ser quebrados e separados, fazendo nossa própria jornada na sombra da morte. Mas também é nossa condição buscar e encontrar conexão, apesar de tudo.
Muitas vezes saí do meu tempo no Death Stranding refletindo silenciosamente sobre a maneira como construímos pontes entre si, mesmo em perigo e isolamento. E nessas semanas, meses difíceis, essa experiência foi muito melhor do que apenas algumas horas de fuga em um simples jogo.
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