Luc Besson ganhou fama internacional quando misturou aรงรฃo e ficรงรฃo cientรญfica no despretensioso e arrasador O Quinto Elemento (1997), que se tornou sucesso de pรบblico, crรญtica e cult movie instantรขneo. Mas nรฃo nos moldes gรณticos do Alien de Ridley Scott e nem na pirotecnia estonteante dos Exterminador de James Cameron. Sua mistura tentava buscar na apariรงรฃo seminua e superpoderosa de Milla Jovovich uma razรฃo para a existรชncia humana, e, mesmo sem ser um Kubrick, conseguiu sucesso em um final subjetivo. De lรก para cรก, nรฃo foi um fracasso, mas tambรฉm passou longe de ser o que se esperava dele. Agora com Lucy, ele tem novamente uma aรงรฃo sci-fi, com uma bela protagonista e novamente discursa sobre a humanidade, mais violento, mais cabeรงa, mais confuso, porรฉm, surpreendente!
Depois de se envolver com um homem, a jovem Lucy (Scarlett Johansson) acaba se metendo sem querer com a mรกfia de Taiwan. Ela รฉ obrigada a servir de mula para os mafiosos carregando uma droga desconhecida em seu corpo. Entretanto, quando acidentalmente o produto vaza em seu organismo, ela ganha a capacidade de usar a capacidade total de seu cรฉrebro, que normalmente, nรฃo passa de 10%. Ele se torna capaz de controlar tudo, fazer coisas extraordinรกrias, mas precisarรก da ajuda do Professor Samuel Norman (Morgan Freeman) para saber o que fazer com tanto conhecimento.
Aparentemente, Luc Besson parece estar mais doido do que nunca quando somos apresentados a um discurso intelectualizado, com tomadas contemplativas e ediรงรฃo รกgil, quase como um videoclipe. E, por pouco, nรฃo somos jogados ao descaso quando tudo vai acontecendo de forma ininterrupta, sem delongas. A explicaรงรฃo รฉ volรกtil como a intensidade da violรชncia que nos รฉ apresentada e de uma hora para outra jรก nos vemos presos na trama frรกgil, meio esquizofrรชnica, mas que estranhamente nos deixa com a curiosidade de saber qual a relaรงรฃo das narrativas paralelas que envolvem Lucy e o professor Samuel.
ร dessa ligaรงรฃo que Besson faz sua mรกgica. Mesmo que a trama lembre, e muito, Sem Limites (2011) de Neil Burger, com Robert De Niro e Bradley Cooper. Mas aqui, o diretor, que sempre assina seus roteiros, cria essa linha tรชnue entre a aรงรฃo desenfreada, surreal, impressionante, que fica a cabo de Johansson, mas vai colocando os โpingos nos isโ na palestra em que o professor discorre sobre o poder ilimitado que um ser humano poderia alcanรงar caso superasse os 10% de uso do cรฉrebros. Nessa batida, o cineasta jรก ganhou credibilidade para nรฃo passar desapercebido.
Mas, o que afasta Lucy de um filme completo em todas estรขncias รฉ o exagero a que o diretor se inclina, e no momento em que o filme mais carecia de cuidados especiais, no desfecho. O diretor e roteirista eleva sua personagem a nรญveis celestiais, claro que com a licenรงa de ninguรฉm saber o que aconteceria naquele caso, mas, ainda assim, o absurdo visual banaliza a intensidade do discurso, deixando inquietante e bobo, causando mais perguntas do que respostas. Um paradoxo cinematogrรกfico, que se nรฃo fosse auxiliado por tiroteios espetaculares do elenco de apoio, deixaria o espectador muito irritado.
Com um orรงamento limitado e apenas dois figurรตes para segurar as pontas, Besson consegue nos surpreender. Johansson รฉ a insanidade em estado puro, provando que a aรงรฃo lhe cai bem, e Freeman รฉ o porto seguro, a autoridade que todo produto precisa para ser aprovado. Provavelmente nรฃo se tornarรก um fenรดmeno como O Quinto Elemento, nรฃo atingirรก nem de longe a excelรชncia de um Kubrick, mas, se a intenรงรฃo de Besson era voltar a ser notรกvel, isso ele conseguiu, com certeza.
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